Autor: Filipe Manuel Neto
**No geral, um bom filme de aventuras na África.**
No geral, gostei deste filme. A África exerce desde sempre um fascínio sobre os europeus e quem já viveu por lá vai certamente reconhecer que deixa uma marca, uma espécie de feitiço ou encantamento. Quem estiver lá por certo tempo nunca esquece a África e traz sempre consigo um pouco desse magnifico e martirizado continente. O filme consegue dar um aroma do encantamento selvagem da África, especialmente das belezas naturais que se escondem nas suas regiões mais intocadas.
E isso leva-nos a falar da produção e dos visuais deste filme, que são simplesmente lindos e nos transportam muito facilmente para a época retractada. Não sou um especialista, mas não observei erros gritantes, tirando alguns adereços que me pareceram modernos demais para o ano de 1896. Sendo um filme que se passa durante a colonização britânica da área interior africana, é naturalmente contado da perspectiva europeia, com a construção de uma linha ferroviária a ser descrita como uma autentica proeza de engenharia e coragem dos colonizadores ingleses, determinados a unir o continente do Cairo ao Cabo a despeito das ambições e reivindicações de outros estados, como a Bélgica ou mesmo Portugal, que se opuseram ao projecto. A cinematografia é linda, as imagens abusam das cores quentes e as paisagens escolhidas como local para a filmagem não podiam ser mais bonitas. Os cenários, os figurinos e os efeitos utilizados no filme cumprem todos os requisitos e dão-nos um toque de estilo e elegância adicional.
Quanto ao elenco, temos alguns pontos positivos e outros francamente negativos a ter em conta. Por um lado, Val Kilmer não parece ter a força necessária para a personagem que lhe foi dada. Ele teria sido muito mais eficaz num papel que não exigisse tanta acção e esforço físico. Ainda assim, parece-me suficientemente crível como engenheiro que vai a África a trabalho e se vê numa situação para a qual não estava minimamente preparado e na qual terá de lutar para se manter vivo. O actor, diga-se, parece realmente estar num estado lastimoso o tempo todo, e eu suspeito que o clima tenha sido um dos motivos que levou a tanto desgaste evidente. Tom Wilkinson, Henry Cele e John Kani são adições de mérito que elevam a qualidade global do elenco e evitam que este seja um filme de um só homem. Infelizmente, detestei ver Michael Douglas aqui. Além de a personagem dele ser um autêntico auto-elogio egóico, foi inventada apenas para satisfazer a vontade deste actor de aparecer onde não tinha espaço ou lugar.
Sendo um filme de aventura onde lidamos com animais comedores de pessoas seria um pouco previsível termos doses elevadas de gore e corpos despedaçados. Porém, o filme é bastante tranquilo e não nos mostra cenas que sejam realmente sangrentas. O roteiro é algo que precisamos de desenvolver um bocadinho. A história deste filme é solidamente baseada num incidente acontecido em Tsavo, no Quénia, em que um par de leões locais (nada parecidos com os usados no filme, pois o leão de Tsavo não possui juba) começou a massacrar os trabalhadores da ponte que os britânicos estavam a construir, causando dezenas de mortos. Porém, não é um retracto fiel dos acontecimentos. Claro que há certo espaço para criar, e eu colocaria todas as cenas de acção mirabolantes e rocambolescas dentro deste patamar de criatividade inerente a qualquer filme. O que não consigo aceitar é a subversão dos factos que acontece quando se insere a personagem do caçador de feras interpretada por Douglas. Essa personagem não existiu, os dois leões foram mortos sem ajuda por John Henry Patterson, ou pelo menos ele assim o reivindicou.
Em 26 Dec 2023
