Autor: Filipe Manuel Neto
**Vale a pena, mas é menos interessante que os primeiros filmes.**
Este filme é o terceiro da adaptação da trilogia literária da autoria de Suzanne Collins mas, ao contrário dos dois primeiros filmes, traz para o cinema apenas uma parte do último filme. Não os li, não faço particular intenção de o fazer por nenhuma razão em especial, pelo que vou ignorar os livros e focar-me no filme.
Neste filme, acompanhamos os primeiros passos de Katniss como revolucionária. Após ser resgatada da arena e se restabelecer dos ferimentos, ela descobre que está com um grupo de rebeldes, os mesmos que alegadamente perderam a guerra civil setenta e cinco anos antes, os mesmos que habitam o supostamente extinto Distrito 13. Afinal, tudo era mentira, tudo era uma manobra do regime de Snow para esconder a existência de um forte movimento de contestação política. Alma Coin, a chefe da Resistência, pede o apoio de Katniss, quer que ela se torne num símbolo, numa mascote. Mas ela só pensa no destino dos amigos, e em especial de Peeta, que está em poder de Snow e parece ter sofrido uma lavagem cerebral.
Bem, depois de o segundo filme se ter revelado excelente era difícil fazer melhor, mas era totalmente possível igualar o resultado. Acho que isso não aconteceu, embora seja por muito pouco. Este ainda continua a ser um excelente filme e a estar dentro de um padrão que não destoa ou desmerece os outros dois. Apenas não me parece ter conseguido ser tão bom. Para começar, detesto quando um filme baseado num livro se divide em duas metades, é quase sempre sinal de que vem aí imensa palha que podia ser perfeitamente retirada numa sala de montagem por um editor hábil. O filme, de facto, arrasta um pouco mais do que os que o precederam, mas se o público se deixar envolver pela história acaba por nem notar muito. É também um filme que tem imenso sci-fi, o mais voltado para esse género em toda a tetralogia.
Jennifer Lawrence manteve-se excelente, mas não traz nada que já não tenhamos visto. Além disso, as tentativas de criar um enredo romântico em torno da personagem dela são fracas e frias, seja qual for o alvo do interesse de Katniss. Donald Sutherland continua a surpreender e dá-nos agora um vilão quase perfeito, na sua megalomania, narcisismo e sede de controlo e de poder. É verdadeiramente um actor excepcional, no seu melhor. Stanley Tucci foi muito mais sério e contido na forma como deu vida a Cesar, um sensacionalista apresentador de TV, mas isso revela o quão a personagem dele é apenas uma marioneta do regime, o que é muito bom. Elizabeth Banks é uma actriz que se revela neste filme, graças à profunda transformação mental e psicológica que a personagem dela vai sofrer aqui, e Woody Harrelson ganha força e seriedade, à medida que se vai tornando num dos mais fervorosos apoiantes do Mockingjay. Julianne Moore alterna entre a doçura contida e uma força e presença carismáticas; Philip Seymour Hoffman, Jeffrey Wright e Jena Malone são muito bons, mas não fazem muito mais do que lhes pedem. Josh Hutcherson continua a soar de modo estranho, ainda que neste filme isso seja quase requerido pela personagem.
A acrescentar a um grandioso elenco e uma boa história, o filme tem excelentes valores de produção: uma cinematografia cuidadosa com bom contraste, excelentes cenários e figurinos e grandiosos efeitos de som e CGI que faz as lutas e combates parecerem querer sair para fora da tela. A banda sonora também merece uma menção especial pela sua eficácia e beleza. Composta por James Newton Howard, é mais uma daquelas que fica no ouvido muito depois de termos visto o filme.
Cheio de acção e com uma excelente história, este filme é excelente, ainda que não seja tão envolvente e intenso quanto o filme que o precedeu. Arrasta-se mais, algumas cenas parecem ser dispensáveis, mas é o que acontece quando, por dinheiro, se desdobra um livro em dois filmes.
Em 03 May 2020