Autor: Filipe Manuel Neto
**Decepcionante e extremamente entediante.**
Já conhecemos há muito tempo a fixação que Quentin Tarantino tem pelos ‘westerns’, e por fazer filmes vistosos, cheios de estilo e de acção coreografada, que parecem simplesmente caricaturas. Este filme honra bastante bem as obsessões deste director.
A trama é difícil e é necessário estar com alguma atenção. Numa viagem a caminho da cidade de Red Rock, uma diligência refugia-se de uma iminente tempestade de neve numa espécie de estação de muda de cavalos. A diligência transporta um caçador de recompensas, que leva presa uma criminosa pela qual ele vai pedir a recompensa quando a entregar ao carrasco da cidade. A eles se juntou outro passageiro, um oficial militar negro. Na estação descobrem que a dona não está, mas deixara um empregado a tomar conta de tudo. Estão lá também algumas outras personagens misteriosas, incluindo um velho general confederado. Não tarda muito que todos comecem a desconfiar uns dos outros e a provocar-se, e que o sangue comece a correr.
Após ter visto – e apreciado bastante – o filme *Django Libertado*, esperava algo mais deste filme. É um filme aborrecido, longo demais, que perde tempo em cenas que poderiam ter sido encurtadas. Boa parte do filme, eu diria que metade, consiste em ver as personagens a conversar e duvidar umas das outras. O facto de isso se dar num espaço confinado poderia ter ajudado, tornando o ambiente mais tenso e claustrofóbico, mas o resultado foi o oposto, com aquela sala exígua a parecer-se surpreendentemente com o Palácio de Versalhes, de tão grande. Após alguma leitura, percebi que Tarantino parece ter feio este filme após encenar uma peça de teatro com o mesmo roteiro. Isso ajuda a perceber as escolhas do director, que se limitou a levar para o cinema uma peça de teatro. Francamente, se eu quisesse ver teatro comprava o bilhete e ia vê-lo à sala grande, com os actores em palco, não é?
Ter Tarantino a dirigir um filme parece funcionar como um chamariz para grandes actores, por pior que seja o filme ou a personagem. Assim, não admira que o elenco do filme seja um ninho de estrelas como Samuel L. Jackson, Kurt Russell, Jennifer Jason Leigh, Tim Roth, Walton Goggins e Bruce Dern. Para mim, o filme estava encaminhado para dar todo o protagonismo a Samuel L. Jackson, mas Jennifer Jason Leigh tira-lhe o tapete em mais de uma ocasião, pela acutilância da personagem dela, pela qualidade dos diálogos e pela ironia e humor com que ela actua. De resto, ela ganhou o Óscar com este filme. Isso não significa que Samuel L. Jackson fez um mau trabalho, na verdade, ele é excelente e o segundo actor que mais se destaca no filme, mas ela foi melhor e encaixou-se brilhantemente na personagem. O restante elenco não desilude, mas também não sobressai nem tem como o fazer. Penso que Bruce Dern fez um trabalho muito bom, mas a personagem dele é largamente secundária e serve só para Jackson fazer um longo e aborrecido monólogo sobre a maneira como matou o filho dele, o qual termina com um tiroteio de desfecho previsível.
Tecnicamente, o filme tem todo o estilo que marca a filmografia do seu director. Filmado no seu formato 70 mm, tem uma cinematografia positivamente bem feita, mas desperdiçada por tudo ou quase tudo acontecer num espaço tão limitado. A duração do filme, como eu disse, excede em muito o aceitável. Os cenários e figurinos são bons o suficiente, mas eu duvidaria acerca da fiabilidade e rigor histórico, porque Tarantino nunca quis realmente saber disso em nenhum dos seus filmes. Os efeitos especiais são bons e a parte final do filme está ensopada em litros de sangue falso e os tiroteios são visualmente impressionantes. A banda sonora, assinada por Ennio Morricone, é boa, tem um bom efeito ambiental, mas o filme não lhes faz honra.
Em 27 Dec 2020