Autor: Filipe Manuel Neto
**Mais uma adição de qualidade à lista interminável de filmes do universo Marvel.**
Quem me conhece sabe que estou bem longe de ser um especialista em banda desenhada, mas reconheço que a Marvel, além de ter criado um enormíssimo leque de personagens, extremamente complexas e com uma biografia cheia de ‘nuances’, criou uma multitude de revistas e álbuns gráficos onde deu a quase cada uma o espaço para brilhar. Muitas vezes foram edições de curta duração, mas que estabeleceram a visão “canónica” sobre cada uma das personagens: heróis que se tornam vilões e, depois, novamente em heróis, que salvam a Humanidade ou a destroem em rivalidades mesquinhas. O que a Marvel está a fazer agora no cinema, e com grande resultado financeiro, é a mesma coisa: criar filmes, sequelas, spin-offs e variações onde cada personagem tem tempo para mostrar valor e arrecadar dinheiro dos fãs para os cofres da empresa.
Sem pressas, tenho visto vários destes filmes, procurando entender as bizarras histórias e personagens que nos trazem. Não é o tipo de filme que eu realmente pague para ver, mas tem valor e méritos de entretenimento que eu reconheço, e que os transformam em ouro para a empresa. Este filme não é, nem de perto, um dos mais notáveis ou bem sucedidos, mas ainda foi capaz de ser nomeado ao Óscar de Melhores Efeitos Visuais em 2017. Foi dirigido e escrito por Scott Derrickson (“Sinister”, “Exorcism of Emily Rose”, etc.), e tem uma narrativa agradável e fácil de seguir e compreender, mesmo para um leigo no mundo da Marvel. A personagem é uma das mais obscuras deste universo, um médico arrogante que se transforma num mago poderoso de uma seita importante sedeada no Nepal. Assim obtém os seus poderes, por esforço e estudo, e não por um acaso ou incidente trágico. O ritmo do filme é bom e o entretenimento é um dos pontos mais fortes deste trabalho.
A nível técnico, o que mais salta aos olhos é a mestria da equipa de efeitos e de CGI, que aproveita o orçamento do estúdio para nos dar um verdadeiro espectáculo visual ao nível do que a Marvel já nos habituou. E ao contrário do que às vezes acontece, nunca sentimos que o filme foi uma desculpa para os efeitos. A cinematografia é parte essencial da beleza visual do filme, com magníficas cores e nitidez, um enquadramento inteligente e com um toque criativo. Há algumas cenas verdadeiramente notáveis, e os efeitos de dobragem do espaço e do tempo são surpreendentemente bons. Os cenários, figurinos e adereços vão acompanhando a qualidade geral do trabalho e atestam o olhar atento da produção. E as cenas de acção? Soberbamente executadas e coreografadas.
O elenco, um outro ponto forte deste filme, foi encabeçado de modo seguro por Benedict Cumberbatch, que nos dá um trabalho ao nível do melhor que já fez na sua carreira. Tilda Swinton, em mais uma personagem andrógina, dá-nos mais um trabalho impactante e que será difícil esquecer. Chitewel Ejiofor e Benedict Wong também fazem excelente trabalho e enriquecem substancialmente o filme com performances fortes. Apesar da centralidade da sua personagem, Mads Mikkelsen teve azar neste projecto: o material que lhe foi dado é substancialmente raso, e obriga o actor a fazer o milagre da multiplicação, dando-nos o seu melhor com muito pouco. Rachel McAdams também foi outra vítima do tratamento superficial dado à generalidade das personagens secundárias, mas não teve a habilidade do actor nórdico para fazer omeletes sem ovos. Ela é apenas um cliché raso: a namorada do herói.
Em 14 May 2024