Autor: Filipe Manuel Neto
**Um filme elegante e bem feito, mas com ideias rebuscadas, forçadas e uma certa ausência de “alma”.**
Eu tenho noção que a minha geração, a “Geração Y”, é a primeira da história do meu país onde a maioria de nós somos filhos únicos. Com o aumento dos custos de educação, saúde e alimentação e os salários baixos e sem aumentos correspondentes, para a maioria das famílias tornou-se uma insanidade ter mais que um filho. E a verdade é que muitos de nós iremos preferir não ter filhos, ou seremos pais tardiamente (acho que isso ajuda a explicar a questão do “amor por cachorrinhos”, no filme e na vida real, sempre saem mais baratos e não constituem elos indeléveis que nos ligam a outros, ex-esposas ou ex-maridos). Eu posso falar por mim: estou perto dos quarenta anos e não tenho ideias de fazer família, não tenho condições e sinto que o meu futuro foi hipotecado pelas crises financeiras que a sociedade tem vivido desde o começo do milénio. Tenho a certeza de que não serei o único a sentir-me assim.
Este filme, de modo alegre e ingénuo, é o retracto de tudo isto ao mostrar a forma como uma criança de sete anos estranha o nascimento do irmão. Eu já compreendi que o amor e a rivalidade são sentimentos contraditórios que fazem parte do que significa ter irmãos: eles podem competir pelo amor e atenção dos pais, mas muitas vezes unem-se quando é preciso. E o filme mostra-nos tudo isto ao criar uma história rocambolesca em que o novo membro da família também é um executivo disfarçado com tiques autoritários e que se comporta como um “Donald Trump de fraldas”: dá ordens, resmunga, grita, despede tudo e todos tal como o pior dos CEO’s que podemos imaginar.
Para ser sincero, só vi o filme agora porque, na época, me pareceu tão desinteressante e forçado que não paguei para o ver no cinema, contrariando o êxito que teve nas bilheteiras e unindo-me a uma massa de desconfiados que pensaram que a crítica especializada podia estar certa na forma como detonou o filme na mídia. E, de facto, temos de concordar que a DreamWorks já fez coisas melhores e parece estar em crise de inspiração. A qualidade dos desenhos e animações, as cores vibrantes, a boa concepção de personagens e o apuro técnico continuam visíveis, mas faltam boas ideias e alguma alma. Este filme esforça-se, apela para os sentimentos fraternais e o público aparentemente respondeu bem, mas não é um filme ao nível dos êxitos passados. Quanto à banda sonora, que aproveita algumas canções notáveis, é razoável, mas não é tão boa que tenha valor por si mesma, e o humor é adequadamente sarcástico, ainda que as piadas possam, por vezes, ser mais dirigidas a adultos do que a crianças (duvido que a maioria das crianças saiba o que é um memorando).
O filme, sendo uma animação, não tem um elenco, mas conta com a participação de vários actores de voz conhecidos, com particular ênfase para Allec Baldwin (que deu a voz ao Bebé) e Steve Buscemi, que deu voz ao vilão da história. Ainda merecedores de destaque e nota positiva, as contribuições de Jimmy Kimmel, Lisa Kudrow e Miles Bakshi.
Em 09 Jun 2024