Autor: Filipe Manuel Neto
**Isto é uma adaptação de um livro do século XIX, ou um baile de máscaras?**
Lançado em 2019, este é apenas mais um entre muitos filmes e séries que adaptaram para o cinema e a televisão o romance “Mulherzinhas” de Louise Marie Alcott, um clássico da literatura norte-americana que vai continuar, certamente, a merecer a melhor atenção dos estudiosos, amantes da literatura, artistas, cineastas, actores e encenadores. Com justiça! Ao contrário do que se poderia esperar, não vou tecer quaisquer comparações entre este filme e os seus predecessores, sejam eles mais antigos ou mais recentes. Sinto que, numa situação como esta, em que se trata de um clássico da literatura, é desejável que cada peça artística tenha o seu próprio valor individual sem estar a ser sujeita a comparações.
A acção segue, grosso modo, o que já conhecemos do livro e dos filmes anteriores, sem sair muito do expectável. Acho, no entanto, que a equipa de roteiro procurou fazer maiores aproximações ao livro original e trazer mais de Louise Alcott para o filme. Isso teria sido melhor aproveitado num filme ligeiramente mais longo: com mais quinze a vinte minutos, o filme poderia ter explorado melhor o material original e as personagens, muito ricas e variadas, que a autora nos deixou. No entanto, eu consigo compreender a pouca vontade da directora/argumentista, Greta Gerwig, e do próprio estúdio, de alongar o filme e tornar a experiência cinematográfica potencialmente desencorajadora para os públicos que não gostam tanto de ficar sentados durante horas seguidas.
A nível técnico, não tenho muito o que dizer deste filme. Os penteados das actrizes são o ponto que considero mais discutível na maneira como tudo foi recriado. Acho impensável que uma menina bem-nascida de 1860 pudesse sair à rua ou ser vista com o cabelo solto ou excessivamente natural, como vemos acontecer em muitas cenas. Há também um certo exagero na maneira como alguns cenários e figurinos foram idealizados, com toques de teatralidade cinemática que são visualmente atraentes – admito isso! – mas que não estão conformes à mentalidade e aos costumes da época histórica retractada. A cinematografia e o trabalho de filmagem funcionaram muito bem, e a edição é boa.
Quanto ao elenco, eu também tenho algumas objecções a colocar. Para começar, todas as actrizes do filme e alguns dos actores, com a excepção de Meryl Streep, agem, falam e se comportam como pessoas do século XXI, sem os modos, maneiras e ademanes usuais na sociedade do século XIX. Isto é, ao invés de procurarem adaptar-se à mentalidade, à fala e ao comportamento daquelas pessoas, os actores simplesmente vestiram as roupas delas e continuaram a ser pessoas do nosso tempo. Isso, meus amigos, não é representar, é um carnaval, um baile de máscaras. Há também alguns casos em que a escolha dos actores é profundamente inadequada, sendo o caso mais flagrante a irmã mais nova da família, uma pré-adolescente que, neste filme, parece tão adulta quanto as suas irmãs. Acredito que os actores não tenham grande culpa de nada disto, limitaram-se a fazer o que lhes foi pedido. No entanto, a má direcção do elenco e a má concepção das personagens condenou todos os seus esforços à absoluta mediocridade, e nem Streep, que costuma ser uma aposta mais do que segura, é capaz de salvar a má prestação colectiva do elenco.
Em 18 Mar 2025