Autor: Filipe Manuel Neto
**Um filme sci-fi memorável e que levanta questões profundamente actuais, se pensarmos nisso.**
Este é um dos grandes filmes sci-fi da década de 80. Partindo de um futuro distópico onde a sociedade se desestruturou e a criminalidade disparou sem controlo, constrói uma trama elegante onde o desenvolvimento das novas tecnologias é abordado através da criação de um polícia cyborg que deverá travar a escalada de crime na cidade depredada de Detroit. Criado por uma empresa privada com fortíssima influência na cidade, Robocop torna-se uma arma temível no combate ao crime, mas o que ninguém sabe é que o presidente da empresa que o criou e controla tem planos sombrios para a cidade.
Há várias temáticas que são inseridas aqui, e que vão da moralidade dos procedimentos corporativos até à ética industrial, e que o filme procura problematizar sem, por isso, se tornar excessivamente sério. Um dos aspectos que, para mim, mereceu maior atenção foi a inépcia das autoridades e representantes da cidade para resolver problemas, pondo-se na dependência de interesses privados e corporativos com agendas próprias. Podemos ver isso na forma como a cidade quase concessiona a sua polícia a uma grande corporação do sector tecnológico. E à medida que vemos Robocop a agir é impossível questionarmo-nos onde é que termina o Homem e começa a Máquina. Afinal, antes de ser transformado, Murphy era um ser humano com memórias e sentimentos que a transformação quase que apaga, juntamente com parte da sua personalidade. São questões que parecem triviais, no entanto, elas nunca se fizeram tão presentes nas nossas vidas como agora: os ciborgues podem ainda ser coisa de ficção científica, mas a inteligência artificial é uma realidade e tenderá a ter um papel cada vez mais significativo na maneira como vivemos e até como pensamos e encaramos o mundo que nos rodeia. Até que ponto isto é positivo? Até que ponto é que representa um corte na nossa liberdade de pensamento e de formação da nossa opinião, consciente e informada? Até que ponto pode a tecnologia servir o Homem sem ser, realmente, controlada por algum grupo ou corporação com segundas intenções? Este é, sem dúvida, um filme que nos faz pensar!
Dirigido por Paul Verhoeven, o filme aproveita o melhor do seu tempo em termos de CGI e efeitos visuais, especiais e sonoros, além de caprichar no trabalho de cinematografia e de edição. É claro, não podemos esperar milagres: tudo foi feito sem apoio de tela verde e outros recursos que nós damos por garantidos, há detalhes que parecem estranhos e até artificiais. Apesar do tema complexo e até pesado, o filme quer ser divertido e dar-nos boas cenas de acção exagerada. Os figurinos, a concepção dos cenários, ambientes e até alguns detalhes dos robôs são pirosos, feitos à medida da imaginação do que podia ser um futuro não muito distante, e é engraçado ver a maneira como eles adivinhavam como nós iríamos viver o presente. A banda sonora destaca-se pelo seu tema principal, um dos mais memoráveis da década, e do cinema sci-fi em geral.
Peter Weller faz um excelente trabalho no filme, mas Nancy Allen, que deu vida à amiga e parceira de trabalho de Murphy, também não se deixa ficar atrás dele, brindando-nos com um trabalho muito competente. Clarence Boddicker, que deu vida ao grande vilão e mestre do crime, faz um trabalho interessante, mas que não tem a necessária profundidade ou solidez. A personagem apenas precisa de parecer detestável e cínica, e pronto. Miguel Ferrer e Ronny Cox, quando estão presentes, são igualmente boas adições.
Em 03 Sep 2025