Autor: Lucas Dionisio Falcão
A nova adaptação animada de Devil May Cry pela Netflix chega com um estilo visual marcante e uma proposta ousada: reinventar o universo de Dante com uma pegada moderna, cheia de referências aos jogos da Capcom e com um roteiro que mistura ação frenética, humor ácido e elementos de teologia, demologia e crítica religiosa. O resultado? Uma temporada que entrega mais acertos do que erros — mas que ainda precisa encontrar o equilíbrio.
A animação se destaca pelo carisma dos personagens, especialmente Dante, que mantém seu estilo debochado e irreverente, com tiradas que lembram muito o Deadpool, além da violência estilizada que marca a franquia. A série também acerta ao introduzir de forma natural temas como fé, ciência teológica e o conflito entre demônios e humanos, indo além do simples tiroteio e espadas.
Visualmente, o início é promissor: cenários bem construídos, cidades vivas e detalhadas, sem aquele aspecto vazio comum em animações mais econômicas. A trilha sonora é outro ponto alto — enérgica, intensa e sempre bem colocada, ajudando a amplificar as emoções nas cenas de ação.
Por outro lado, o uso crescente de animação 3D quebra a imersão em vários momentos. A mistura entre 2D e 3D nem sempre funciona bem, e o contraste é gritante, especialmente quando os personagens ganham modelagens que destoam do resto da estética da série. É um detalhe técnico que pesa contra a experiência geral.
Um ponto que pode incomodar alguns é o desenvolvimento da Lady. Embora sua participação ganhe destaque e traga boas discussões morais — principalmente sobre a ideia de que "nem todo demônio é igual" —, em certos momentos ela parece forçada. A tentativa de torná-la uma personagem badass vem acompanhada de exagero no uso de palavrões e cenas em que ela elimina demônios com mais facilidade do que o próprio Dante, o que causa certa estranheza.
Isso se agrava quando notamos que, no início da série, Dante é mostrado como extremamente poderoso, mas após seu encontro com a Lady, é como se os produtores esquecessem o nível que ele tinha. Há um evidente downgrade no personagem — até mesmo depois de uma suposta evolução, onde era esperado que ele se tornasse ainda mais forte, ele continua tendo dificuldades desproporcionais contra seus inimigos. Essa inconsistência acaba minando um pouco o impacto das lutas e da própria construção do herói.
A presença de um coadjuvante misterioso (o “coelho”) dá um tempero interessante à trama, com uma construção que remete ao arquétipo do anti-herói caótico. Sua história e motivações são bem desenvolvidas, e sua jornada é uma das mais intrigantes da temporada.
A narrativa flui com ritmo acelerado, o que ajuda a manter o público preso, mas cobra seu preço no final: a reta final é corrida, com resoluções apressadas e decisões de roteiro que contradizem o próprio desenvolvimento dos personagens. Há bons dilemas morais, especialmente envolvendo a Lady e o vice-presidente, mas muitos deles são deixados de lado ou resolvidos de forma abrupta.
Veredito final:
Devil May Cry da Netflix é uma animação que acerta na ambientação, no ritmo e em criar uma nova abordagem para o universo da franquia, mas não é fiel aos jogos — seja na estética, na personalidade dos personagens ou no desenvolvimento da história. Apesar disso, é divertida, cheia de estilo e tem muito potencial, principalmente se conseguir ajustar seus excessos e incoerências em uma futura temporada. Para quem curte ação, demônios e uma boa trilha sonora, vale a pena conferir.
Em 07 Apr 2025