Autor: Filipe Manuel Neto
**Uma boa comédia romântica que me parece ter sido prejudicada por alguns preconceitos em relação à profissão mais antiga do mundo.**
Vivian é uma prostituta de rua. Não sabemos quase nada da vida dela, nem as razões pelas quais enveredou pelo caminho da prostituição, mas é notoriamente bonita e sobressai no meio das outras meninas que, junto com ela, esperam por quem as queira. Por acaso, o seu caminho cruza-se com o de Edward Lewis, um milionário que fez fortuna comprando e desmantelando empresas falidas. Não sabemos bem porque ele decide contratá-la, parece uma decisão tomada no momento... mas o facto é que ele muda a vida dela de um jeito que me fez lembrar "Breakfast at Tiffany's"...
Esta comédia romântica parte de pressupostos bastante fantasiosos. Mesmo os milionários que contratam prostitutas não costumam ir às ruas procurá-las nem se relacionam com elas. Por outro lado, nunca uma prostituta de rua pareceria tão limpa e imaculada quanto Julia Roberts neste filme. Há aqui algumas falhas de realismo que podem comprometer a história, dependendo da importância que cada um lhes der. Porém, em última instância, é um filme acerca de sonhos. "Qual é o seu sonho? Toda a gente em Los Angeles tem um sonho." É o que diz um homem nas ruas durante o filme, e isso quase pode ser a moral da história: há sonhos que, com um toque de sorte, podem tornar-se reais.
Adorei o desempenho de Julia Roberts... este filme ajudou a actriz a saltar para o estrelato, o que foi bastante justo. Ela tem talento e tem presença, como viríamos a constatar em filmes posteriores (Notting Hill, Erin Brockovich etc.). Richard Gere faz um bom par romântico com ela e é credível no papel de um milionário que fracassou no amor e parece carente de atenção feminina. Os dois dominam o filme e dão vida aos melhores momentos, que vão de cenas românticas e comoventes às mais hilariantes que podemos ver. Junto deles, um elenco secundário capaz, mas discreto, onde se agiganta Hector Elizondo, no papel de um rígido e profissional gestor de hotel.
Penso que este filme foi desde sempre uma aposta arriscada, quanto mais não seja pelo forte preconceito que a sociedade ainda mantém para com a prostituição. E acredito que alguns terão escrito críticas severas a este filme apenas por envolver uma prostituta na história. Porém, as prostitutas não são criaturas vis, poluídas e doentes que devem viver à margem da sociedade. Muitas vezes, são mulheres (e homens) que não tiveram sorte na vida, ou fizeram escolhas erradas, ou imigrantes que foram enganadas e estão a tentar ganhar dinheiro sem fazer mal a ninguém, muitas vezes debaixo da ditadura cruel de chulos que só pensam em lucros. Glamourizar a prostituição é um erro, mas diabolizar é pior ainda. É sinal de uma mente pequena e de falta de valores cristãos e de empatia para com quem teve menos sorte que nós. Pior do que viver ganhando o dinheiro com o próprio corpo é matar, ou roubar, e não faltam filmes que glamourizam o roubo e o assassinato, sem que ninguém se importe com isso.
Em 22 Sep 2019