Autor: Filipe Manuel Neto
**Uma nova vida para Godzilla, depois de anos a ser bastante maltratado no cinema.**
Confesso que nunca fui fã de Godzilla porque sempre me pareceu irrealista. A quantidade de maus filmes com o monstro destruidor de cidades também não ajuda. Assim, não é de admirar que eu tivesse poucas expectativas em relação a este filme e tenha decidido não o ver no cinema mas em casa, quando passou na TV.
Senti, logo de início, que o filme se preocupa em criar uma história lógica para sustentar o monstro. O tema nuclear está lá, mas agora ele não foi criado pelas bombas humanas, ele existia há milhares de anos, tirando força da radiação atómica, como uma bateria carregável. Mesmo assim, não me senti totalmente convencido, dado que a radiação mata e, aqui, os seres humanos parecem à vontade com uma criatura gigantesca que certamente emana mais radiação do que cinquenta mil reactores. Há mais momentos em que tudo soa a falso e a história revela fraquezas, mas é melhor não levar adiante essas questões se queremos dar uma chance ao filme.
O roteiro é simples: tudo começa com um acidente nuclear trágico no Japão e a busca de Joe Brody para saber o que aconteceu realmente. A sua busca faz com que ele e o seu filho, agora um militar americano, tropecem numa verdade escondida: a de que existem no mundo criaturas colossais, mais velhas que a Humanidade e na maioria adormecidas, que podem acordar e pôr em perigo o nosso modo de vida. Elas são monitorizadas por uma organização secreta internacional chamada Monarch, e um dos seus responsáveis, Ishiro Serizawa, coloca esperanças na mais forte e poderosa delas - o lagarto Gojira - para controlar todas as restantes. O resto do filme é um rasto de destruição, com os humanos aos gritos, soldados a disparar, coisas a arder e criaturas colossais em batalhas titânicas.
O filme apresenta um elenco cheio de estrelas famosas mas não é o tipo de filme que vemos pela qualidade interpretativa dos actores nem temos a oportunidade de nos importarmos verdadeiramente pelas personagens. De resto, boa parte dos actores tem pouco tempo em cena e pouca coisa para fazer. É o caso de Bryan Cranston, Elizabeth Olsen e Juliette Binoche. Aaron Taylor-Johnson é fraco para liderar o filme mas funciona razoavelmente como figura de acção. Ken Watanabe é o actor mais marcante de todo o filme, funcionando como uma espécie de "Mestre Yoda" que sabe mais que todos os outros e tem sempre um qualquer chavão de sabedoria na manga. Watanabe soube sempre manter-se acima do restante elenco e dar-nos um bom trabalho.
Tecnicamente, o filme é grandioso e justifica os milhões do orçamento. Aposta na criação de um ambiente ameaçador, com muita coisa a acontecer de noite ou em cenários nebulosos, onde não vemos tudo. Há cidades arrasadas até ao chão, muito ruído de todo o lado, poeira e rugidos animalescos de ensurdecer. Os efeitos sonoros e visuais estão de parabéns, assim como todo o departamento de CGI e computação. Cenários bem feitos, bons adereços, um bom trabalho de mistura de som e de edição também são bastante evidentes. A banda sonora, responsabilidade de Alexandre Desplat, é competente mas não impressionante ou épica, como poderia ser.
De todos os filmes que já vi envolvendo Godzilla, este é certamente o melhor. Mas é o melhor porque os outros eram maus ou fracos demais para competir com um filme que tem mais dinheiro, mais actores sonantes e melhores valores de produção. É um filme que podia ser melhor, mas que é suficientemente bom para valer a pena.
Em 02 Mar 2020