Autor: Filipe Manuel Neto
**Mais estilo do que conteúdo.**
Este foi o meu primeiro contacto com a obra cinematográfica de Andrei Tarkovsky, um cineasta soviético que viria a terminar a sua carreira fora do seu paÃs natal quando caiu em desgraça por supostamente gastar demasiado dinheiro em filmes pouco dignos dessa despesa. Uma atitude lamentável, mas tÃpica de paÃses que preferem gastar dinheiro em mÃsseis do que em apoios à cultura e à educação, principalmente após se considerar quão perigosa e insubmissa pode ser uma população culta e capaz de pensar sem ninguém de um partido a dizer o que é o certo.
Este não é, todavia, um comum filme soviético, carregado de mensagens subliminares, mais ou menos directas, diabolizando os ricos e enaltecendo o esforço e dignidade dos trabalhadores. Pelo contrário. Tarkovsky leva-nos a um mundo desolado, aparentemente refém da autoridade repressiva. Não há nada bonito ali. E existe um espaço onde ninguém pode ir, chamado Zona, na qual existe, supostamente, uma sala que torna reais os sonhos de quem ali chegar. Porém, a dificuldade é imensa.
Sendo um filme russo, é obviamente um filme enorme, maçudo e pesado. Convenhamos que é expectável: os russos gostam de coisas grandes. Grandes paÃses, grandes exércitos, gigantescos canhões e mÃsseis. A Rússia cultiva esse gosto pelo gigantismo de que o Tsar-Pushka é sÃmbolo proeminente. É difÃcil ver tudo, a forma como o filme se desenvolve, numa lentidão deliberada, é extenuante e sombrio. A cinematografia é parcialmente em sépia (a cor vem mais tarde, e as cores associam-se directamente à entrada na área proibida) e foi bem trabalhada, assim como o cenário e os locais de filmagem. O resto pura e simplesmente não interessa: é um filme que é quase silencioso e que coloca o estilo acima do conteúdo.
Em 31 May 2023