Autor: Filipe Manuel Neto
**Demasiadamente complexo, não tem um roteiro coerente nem um director capaz.**
Este filme sci-fi é bastante interessante, na medida em que dá muito em que pensar depois de o vermos. Foi arrasado pela crítica e muito mal recebido pelo público e eu até entendo as razões, na medida em que não é bom e tem problemas graves, mas convenhamos: há filmes muito piores que batem recordes de bilheteira e colocam os críticos especializados de joelhos.
O roteiro é complexo e exige atenção: tudo se passa em torno do Dr. Will Caster, um cientista que, juntamente com outros, quer criar uma inteligência artificial parecida com o ser humano, que entenda coisas em vez de só as quantificar e ligar para obter soluções, como as máquinas. A ideia teria aplicações diversas ao nível da medicina, educação, defesa etc. mas abre uma caixa de pandora de questões éticas, morais e religiosas, e isso incomoda muita gente. Após um atentado e diante da morte certa, a esposa do Dr. Caster resolve dar o passo decisivo e inserir as memórias, consciência e personalidade do marido no supercomputador em que eles vinham trabalhando. Assim, após a sua morte, a máquina cria uma inteligência artificial que se assemelha em tudo ao falecido cientista, excepto na ausência de alma e escrúpulos éticos.
Há muito de complexo neste filme, pelo que não é adequado a quem não estiver disposto a pensar e a prestar atenção. Porém, aos poucos, o filme vai-se perdendo no próprio enredo e enrodilha-se numa trama cada vez mais complexa levando a um clímax de acção que pareceria, no início, exagerado e pouco interessante. Perde, com isso, coerência e lógica. Mas o filme é bem-sucedido no afã de lançar tópicos de discussão ao nível da ciência, religião, moral e ética. Afinal, a entidade cibernética criada neste filme é verdadeiramente a criação de um deus humano e cibernético, omnipresente e omnisciente. O filme é rico em assuntos passíveis de debate e vale a pena vê-lo sob esse prisma.
Dirigido por Wally Pfister, que é mais conhecido pelo seu trabalho na cinematografia, tem um bom elenco, cheio de nomes conhecidos. Todavia, a falta de um enredo coerente e direcção estruturada prejudicaram muito o trabalho dos actores. Rebecca Hall é a actriz que recebe um material melhor para trabalhar e o resultado é que trabalha melhor e mostra mais talento que o restante elenco. Paul Bettany costuma ser uma aposta segura mas parece não saber bem o que fazer aqui. Morgan Freeman está desinspirado e Johnny Depp não faz mais do que dizer as falas e dar a cara. Kate Mara e Cillian Murphy não têm tempo para fazer muita coisa.
Tecnicamente, é um filme regular. Um CGI regular e boas paisagens e cenários, para além de uma cinematografia muito boa, onde se pode ver a atenção do director, que percebe desse tópico muito mais que de roteiro e de direcção. De facto, ao terminar este filme, concluímos facilmente que é um filme que promete muito e parece muito bom no início, mas desenvolve-se tão mal e quer ser tanta coisa que, em conclusão, acaba por não conseguir ser coisa nenhuma. Tudo por causa de um mau director e um mau argumentista. É pena.
Em 24 Jun 2020