Autor: Filipe Manuel Neto
**Um filme com tanto potencial arruinado que nos deixa irritados.**
Há certos filmes que nos fazem sentir vontade de esmurrar o director e o roteirista… vemos que têm potencial para mais, mas são arruinados e despedaçados pela falta de competência deles. É o caso deste filme, com excelentes premissas de ‘suspense’ e de mistério, que a estupidez do director e roteirista Richard Kelly se encarrega de demolir gradualmente.
Como eu disse, o filme começa realmente bem: nos anos Sessenta, a década da corrida espacial, um casal recebe um misterioso pacote com uma caixa, aparentemente sem grande utilidade, na qual existe um grande botão dentro de uma redoma de vidro. Pouco depois, recebe a visita de um estranho muito bem vestido que lhes diz que a caixa será deles durante um dia, no qual irão decidir se carregam, ou não, no botão. Se decidirem fazê-lo, eles ganham automaticamente um milhão de dólares, mas alguém no mundo, que eles não conhecem, irá morrer. O dilema moral é devastador e faria qualquer pessoa pensar muito: por um lado, o valor oferecido significava, na época, o resto de uma vida sem preocupações. Por outro, é dinheiro sujo de sangue, mesmo que não se conheça a pessoa que morre. O filme teria feito bem se ficasse por aqui, e tecesse à volta desta premissa um drama moral e familiar carregado de tensão, aproveitando igualmente o facto de a oferta ser talvez boa demais para ser real, e de a identidade e empregadores daquele homem misterioso serem, quiçá, ainda mais misteriosos do que ele mesmo. Mas não o faz… estende-se demasiado, explora demasiado a questão espacial sem que daí advenha algo realmente bom para a história e, até certo ponto, parece querer incluir alienígenas ou outras forças cósmicas estranhas. Enfim, o filme torna-se uma confusão que elimina a tensão inicial e estraga completamente todo o conjunto.
O elenco conta com a participação de Cameron Diaz, que faz um trabalho satisfatório e cheio de qualidade, mas não é capaz de salvar o filme por si mesma. Ainda mais impressionante é o bom trabalho de Frank Langella. O actor, que já parece ter apetência por personagens com um toque sinistro e sombrio (lembro-me da forma sombria e elegante como trabalhou em *Frost/Nixon* e também do seu excelente trabalho em *A Nona Porta*), não podia parecer mais tenebroso aqui: com parte do rosto queimado, roupas elegantes de corte impecável e um carro preto digno de um CEO empresarial, Langella é grandioso na sua personagem e as cenas iniciais, em que mostra a caixa e faz a sua oferta, com voz excelentemente modulada e profunda, são verdadeiramente as melhores do filme para mim. Não consigo ver actor melhor do que ele para a personagem. O restante elenco limita-se a gravitar em torno destas duas figuras do cinema e a dar-lhes todo o espaço que precisam para o seu trabalho. James Marsden ainda tenta sobressair, mas não tem como ombrear com os colegas.
Tecnicamente, o filme tem altos e baixos. A cinematografia é excelente e aproveita muito bem tudo o que tem, com um toque sombrio e baixo contraste. Os cenários e figurinos são bons, mas falta um pouco mais de noção de tempo: o filme decorre na década de Sessenta, mas se tirarmos os móveis da casa, as tecnologias antigas (a TV analógica, o telefone com fio)e o tema da corrida espacial, tudo o resto podia facilmente ser dos anos Noventa. O trabalho de maquilhagem é bom, particularmente o dedicado a Langella, e há algum CGI bom e discreto. A banda sonora é esquecível e quase não se faz notar.
Em 18 Apr 2021