Autor: Filipe Manuel Neto
**Um bom filme sobre o lado mais humano da guerra.**
Este é um daqueles filmes que nos faz pensar. Não só aborda um tema indigesto — tão duro de engolir quanto aquilo que estes soldados fazem — como ainda nos faz pensar se existe de facto um propósito, uma razão de ser no sacrifício de tantos jovens que morrem na guerra. De facto, a guerra é abominável, só gosta dela quem nunca esteve nela. Eu nunca estive, mas o meu pai combateu nas guerras que Portugal manteve em África, protegendo as vidas de civis que nada tinham a ver com a situação política que então se vivia. Não foi uma guerra bonita, mas não há guerras bonitas. O que se passou até muito recentemente no Afeganistão e no Iraque também foi feio e devia ter sido evitado. Mesmo assim, é louvável a disponibilidade, coragem e sentido de dever dos jovens que, quando o seu país toca o clarim, se apresentam a servir a bandeira. Mas vamos ao filme.
O filme gira em torno de um soldado que, após ter combatido pelo país, voltam para casa para cumprir os últimos três meses de serviço militar tranquilamente. É então nomeado para apoiar um oficial mais velho na difícil tarefa de ir à casa de familiares de outros militares para lhes dar a notícia da morte deles. Existe um manual e regras a respeitar, como falar só com o parente mais próximo e nunca lhe tocar ou se emocionar, mas é algo difícil de fazer numa missão que é tão ingrata: eles são insultados, por vezes agredidos e vêem, em primeira mão, a dor da perda daqueles homens. Quando as coisas se revelam mais difíceis e desgastantes do que se poderia pensar, os dois homens procuram descomprimir para não quebrarem: bebem, ouvem música alto, esmurram paredes, envolvem-se em relações efémeras.
O elenco conta com dois excelentes actores, que dividem o protagonismo e colaboram muito bem juntos: Ben Foster e Woody Harrelson. Os dois actores estiveram excelentes, e é difícil até dizer se um deles foi melhor, porque ambos trabalharam de maneira totalmente simbiótica. A verdade, porém, é que este filme conseguiu ser, para mim, o melhor trabalho de Harrelson até agora (pelo menos de todos aqueles que eu tenho visto). Outro actor excelente que aparece e brilha neste filme é Steve Buscemi, no papel de um pai de um soldado falecido. Ele brinda-nos com uma das cenas mais pungentes e tensas do filme. Não gostei muito de Samantha Morton. A actriz é boa, mas a personagem é pouco interessante, na medida em que é efémera.
Dirigido por Oren Moverman, o filme não nos traz um roteiro definido, mas revela-nos muito sobre as consequências humanas domésticas das guerras dos EUA no estrangeiro. Mesmo que a guerra esteja longe, afecta sempre quem a combate, e o director foi muito hábil a explorar a sensibilidade do público para tal questão. Tecnicamente, o filme tem uma boa cinematografia, com boa cor e luz, e é extremamente realista na maneira como foi filmado e editado. Parece até um documentário, em certo sentido, e isso foi seguramente algo desejado pelo director. O bom uso dos cenários e os figurinos credíveis ajudam a construir este realismo agradável. Sem efeitos visuais e sonoros incomodativos ou estridentes, o filme deixa o palco livre para o que vamos ver, e até a banda sonora é pouco intrusiva.
Em 23 Aug 2021