Autor: Filipe Manuel Neto
**Um filme muito feminino, com um bom mistério, dirigido com alguma habilidade, mas que não é melhor devido a vários pequenos problemas e à ausência total de tensão dramática.**
Bons livros geralmente dão origem a bons filmes… se tiverem pessoas que sejam hábeis o bastante para os verter inteligentemente para a tela. Eu ouvi falar muito bem do livro original, mas como nunca o encontrei à venda na minha língua acabei por nunca o poder ler. O que posso fazer é falar estritamente do filme, e no geral fiquei satisfeito.
Não pude deixar de sentir que o filme demorou um pouco a captar realmente a atenção: penso que só decorridos vinte minutos do início é que senti que havia aqui alguma coisa interessante. Porém, eu consigo compreender a necessidade de introduzir claramente as três personagens femininas centrais da trama. Também gostei de ver a forma como o roteiro tratou a personagem principal: o filme começa com ela, e ela parece alguém bem simpático. Aos poucos, isto muda: a personagem é confrontada por outras e vai reagindo de maneiras antipáticas, bruscas ou irreflectidas (estou a ser simpático). Afinal ela é a vilã! Só muito perto do fim, com o esclarecimento da trama após novas reviravoltas, é que percebemos mais. Isto está bem feito e o filme, decentemente dirigido por Tate Taylor, sabe usar bem o mistério.
Há, contudo, alguns problemas que impedem o filme de ser realmente bom: apesar dos mistérios e reviravoltas, sente-se que é um filme morno, sem uma tensão dramática que faz falta e que seria um bónus muito agradável. Também achei o filme lento, embora me pareça um problema menor. Perde tempo em algumas cenas, sim, mas eu lidei bem com o assunto. Uma amiga minha disse também que a história do filme se assemelhava a um roteiro de telenovela brasileira. Eu não vou discutir isso, em parte estou de acordo com a maneira como ela viu as coisas, mas não me pareceu tão melodramático ao ponto de merecer a comparação. Aliás, se há uma coisa que parece ausente deste filme é o amor ou, pelo menos, a noção romântica adocicada que temos dele.
Sendo um filme tão feminino e voltado para públicos femininos (pelo menos, eu fiquei com essa sensação), é bastante natural que os actores masculinos não sobressaiam, mas o que acontece aqui é mais radical: as personagens masculinas são bastante esboçadas e até mesmo ignoradas, e eu senti que só apareciam quando tinham mesmo de aparecer. É pena, porque o filme conta com uma boa interpretação de Justin Theroux, que parece até querer dar-nos mais e fazer melhor, mesmo sem material para isso. Edgar Ramírez faz um trabalho decente, mas Luke Evans não faz muitos esforços. Os holofotes vão para Emily Blunt, que nos dá um dos trabalhos mais interessantes da sua carreira (até àquele momento) e merece a nossa atenção sempre que aparece em cena. É pena que Rebecca Ferguson e Haley Bennett não a consigam acompanhar e fiquem sempre na sua sombra.
Em 06 Oct 2023