Autor: Filipe Manuel Neto
**Interessante e mentalmente provocador.**
Este filme é uma espécie de conto-de-fadas moderno e fala, essencialmente, do direito a ser diferente e da injustiça que podemos cometer quando julgamos uma pessoa que não conhecemos porque é diferente.
A história, ambientada numa pequena vila francesa nos anos 60, mostra as dificuldades que uma mulher sente em integrar-se e fazer prosperar uma loja de chocolates. O problema é que ela não se encaixa nessa sociedade, muito conservadora e religiosa, liderada por um aristocrata profundamente antiquado, apegado aos antigos privilégios da sua linhagem. Ela é uma mulher moderna, independente e mãe solteira, e os seus doces têm a capacidade de despertar os desejos mais secretos daqueles que os comem. As coisas pioram com a chegada de um grupo de ciganos, que a aldeia vê inicialmente como desordeiros.
Para aqueles que estão desatentos, o filme pode parecer uma dura crítica à Igreja e ao conservadorismo, mas não é bem assim. Ele usa a religião como um veículo para criticar a hipocrisia daquelas pessoas, que dizem uma coisa e agem de maneira totalmente oposta por conveniência, timidez ou medo de serem criticadas. É um convite para sermos nós próprios, nos assumirmos como somos, com frontalidade, e pararmos de olhar para tudo o que os outros fazem ou deixam de fazer.
O filme tem excelentes cenários e tudo se encaixa muito bem no contexto e no tempo histórico. A ligação entre Vianne e os antigos povos ameríndios parece um pouco forçada, mas acaba por ser digerível com o desenrolar do filme. Os actores fizeram um óptimo trabalho mas há três que merecem uma menção especial, por mérito: Juliette Binoche interpreta Vianne de uma forma muito agradável e convincente, Alfred Molina brilhou no papel do ultra-conservador Conde e Judi Dench deu vida à excêntrica e despreocupada Armande de uma forma absolutamente bela. O filme também apresenta Johnny Depp como chefe cigano, mas ele está claramente a mais neste filme, e foi aqui enfiado para fazer par romântico com a protagonista. A sua personagem não se encaixa muito bem e os dois actores não desenvolveram uma química eficaz. Foi um erro conceber a personagem desta maneira.
Em 12 Jun 2018