Autor: Filipe Manuel Neto
**Um filme interessante, em que a hipocrisia da política é explorada habilmente.**
Este filme é difícil de avaliar. De início, parece uma espécie de sátira à política americana, onde um congressista americano, de modo totalmente improvável, vai ter um papel determinante no desenrolar de um dos mais importantes conflitos do fim do século XX: a invasão soviética do Afeganistão.
De facto, o texano Charles Wilson é o congressista mais improvável para uma situação que tinha tanto de delicado quanto de arriscado para os EUA: no início do filme, vemos com ele se diverte com mulheres, álcool e drogas, e a forma como ele parece ser irresponsável, apenas mais um político a viver às custas dos contribuintes. No entanto, vai ser capaz de lidar com a situação no Afeganistão e de ser o homem certo para a tarefa, financiando através da CIA os guerrilheiros que contiveram os russos. Na vida real, ele serviu no Congresso entre 1973 e 1997, e a sua contribuição real para os acontecimentos relatados aqui é, no mínimo, discutível. No entanto, o filme soube aproveitar o livro biográfico de George Crile e fazer uma boa história em cima desse material, onde os americanos fazem o que têm de fazer, cuidam dos seus interesses, a despeito do que acontece no país dos outros. Sim, o caos e o drama humano dos afegãos é apenas um dano colateral e nada mais.
Tom Hanks domina bastante bem o filme e é excelente no trabalho que tem pela frente. Não é o melhor filme dele, e eu penso que o actor está dentro de uma certa zona de conforto aqui, sem se desafiar muito a si mesmo, mas é um desempenho positivo. Julia Roberts também esteve bem, especialmente quando contracenou com Hanks. Ela não tem aparecido muito e parece ter tido algum azar no seu percurso, mas a participação neste filme foi uma escolha certeira da actriz. Seymour Hoffman teve um papel simpático neste filme, no papel de um espião veterano e sarcástico, que se torna adorável aos nossos olhos pela forma realista e dura como encara o que o rodeia. Apesar de ter ficado famoso com “Capote”, é neste filme que eu sinto que Hoffman realmente mostra o que vale.
Tecnicamente, o filme é ótimo e tem bons valores de produção, mas não sobressai, deixa a história e o elenco destacarem-se. A cinematografia é boa e faz um uso interessante de uma série de antigas filmagens, e apesar de o filme nem sempre ser feliz em nos fazer sentir que esta história ocorre nos anos 80 (os cenários e figurinos por vezes parecem pouco datados), isso vai sendo ultrapassado pela menção recorrente a personagens e acontecimentos daquela época. A banda sonora é boa e faz o seu papel de modo discreto.
Em 11 Jul 2021