Autor: Filipe Manuel Neto
**Um trabalho magnifico, se considerarmos a época em que foi lançado e os recursos técnicos que existiam.**
Sinceramente, não esperava muito deste filme. Foi um filme que falhou nos cinemas e que só singrou quando passou para o VHS, adquirindo admiradores desde então e a tornar-se um dos mais respeitados filmes de sempre. Ambientado numa Los Angeles profundamente distópica, levanta várias questões filosóficas e sociológicas em torno da natureza humana, do rumo da humanidade, da nossa relação com as tecnologias e da nossa moralidade em geral.
Ver este filme em 2022 foi engraçado porque a acção do filme, lançado em 1982, se situa no ano de 2019. Isto é, foi situado num futuro que, agora, é passado para mim e nunca se concretizou (e ainda bem). O enredo do filme não é fácil: a humanidade colonizou outros planetas enquanto destruía a Terra e criou andróides humanos, muito realistas, enquanto se destruía a si mesma. Porém, os andróides, chamados replicantes, saíram do controlo, e agora são caçados e mortos, ou usados para os fins mais torpes. As metáforas são claras, há muito material filosófico, e que nos deixa a pensar durante um bom tempo.
Ridley Scott dá-nos, com este filme, uma das suas obras-primas. O filme é magnífico em todos os sentidos e vale a pena dar-lhe o tempo necessário para nos surpreender. Cria um enredo neo-noir onde ninguém é inocente ou angelical, e onde o perigo está em toda a parte. A iluminação, as venezianas nas janelas, a indispensável “femme fatale”, todos os componentes clássicos do ‘noir’ estão aqui, num filme francamente colorido e com cenários e paisagens que combinam o futurismo mais grandioso com a decadência e sujidade do mundo que destruímos. Os diálogos são memoráveis e estão cheios de momentos profundamente simbólicos. As personagens são ricas, densas e complexas, e é extraordinário pensar que ainda não compreendemos realmente, passadas várias décadas, se a personagem principal é humana ou não.
De facto, parece que o tempo não passou por este filme: se pensarmos que é dos inícios dos anos 80, é incrível que seja tão visualmente poderoso e que tenha uma cinematografia tão boa. Parece um filme feito há dez anos. Os cenários e figurinos não podiam ser melhores, e os efeitos especiais são estonteantes. A banda sonora, composta por Vangelis, é suave e hipnótica.
A somar a tudo isto, temos Harrison Ford, num dos trabalhos mais subestimados da sua carreira. Ele faz um trabalho realmente bom, e merecia ter sido mais reconhecido por isso. Sean Young também merece um aplauso pela forma como deu vida à sua personagem, uma replicante que pensa realmente que é humana. Há ainda outros actores muito bons, e podemos destacar muito especialmente Rutger Hauer, mas eles não ombreiam com este duo de artistas.
Em 13 Jan 2023