Autor: Filipe Manuel Neto
**Melhor que muitos filmes de terror actuais.**
Para dar uma chance a este filme, o ideal é esquecer um pouco a lógica, porque o roteiro e a trama não têm muita lógica e, se nos pusermos a pensar acerca disso, tudo se desmorona facilmente. Eu senti isso depois de ver o filme. E acreditem em mim, o filme é tenso e assusta um pouco, e vai valer a pena dar essa chance. Para mim foi.
Tudo começa num hospital de Roma, onde o filho de um alto diplomata americano ali radicado acaba de morrer à nascença. Por sorte, ou por mero acaso, uma jovem mãe italiana morre também, ao dar à luz a um menino saudável. O diplomata resolve, então, que vai ser o pai daquela criança orfã e criá-la como sua. Acontece que, com o passar dos anos, o jovem menino parece ser acompanhado por personagens insólitas e um cão assustador, e cosias tenebrosas e mortes acontecem quando ele está por perto.
Bem, o filme não é assim tão bom na medida em que a história é algo irrealista e tudo soa bastante exagerado mas, colocado no contexto dos filmes de terror em geral, não há dúvidas que assusta mais do que muitos filmes carregados de CGI e pulos que são feitos agora. Ao contrário dos filmes de agora, que são baseados na quantidade de pulos que podem provocar, é um filme que se alimenta muito do ambiente e da tensão permanente, lentamente construída. Isso comigo funciona muito melhor do que fazerem-me saltar na cadeira. O trabalho dos actores também é bastante bom. Gregory Peck era já um veterano e fez um excelente trabalho, é bastante credível no papel dele e a sua dúvida crescente acerca da natureza do seu filho parece verdadeiramente real. Lee Remick é igualmente uma boa actriz. Ela dá um bom apoio a Peck e o trabalho dela fica ainda mais interessante à medida que vai demonstrando a depressão e angústia crescentes da personagem dela. Billie Whitelaw é verdadeiramente assustadora e uma adição importante para criar suspense e intensificar o filme. David Warner esteve bem, mas achei a personagem dele fraca e pouco credível mesmo para os padrões deste filme. Patrick Troughton foi bastante credível no papel de um padre que perdeu o juízo, mas também tem uma personagem discutível.
Tecnicamente, o filme não é uma obra prima mas satisfez as minhas expectativas. Richard Donner foi um bom director e garantiu um bom trabalho de edição e pós-produção, boas filmagens e trabalho de câmara. O filme é um pouco datado: a cinematografia, um pouco apagada, sem cor e desinteressante aos nossos olhos, era muito comum nos filmes da década de Setenta, e as roupas, penteados e carros são dessa década também. Mas eu lidei bem com isso, afinal os filmes de hoje também vão parecer datados daqui a uns cinquenta anos. De todos os valores de produção eu destacaria especialmente as boas locações de filmagem e, principalmente, a extraordinária banda sonora de Jerry Goldsmith, vencedora do Óscar de Melhor Banda Sonora naquele ano. É raro, mas às vezes acontece em filmes de terror encontrarmos uma banda sonora que consiga, de facto, tornar o filme ainda mais assustador.
Não sei se este filme atingiu já o estatuto de clássico ou *cult*, mas creio que merece ser revisitado nos nossos dias. Não é uma pérola, não vai marcar a vida de ninguém, mas faz o que um filme de terror deve fazer: mexer com os nossos medos e fazer-nos sentir desconfortáveis a ponto de olharmos ao nosso redor se ouvirmos um barulho na sala enquanto o vemos.
Em 16 Apr 2020