Autor: Filipe Manuel Neto
**Uma comédia muito boa e geralmente palatável para quase todos.**
Acabei agora mesmo de ver este filme, com uma amiga minha, e ambos ficamos satisfeitos com o que vimos. O filme é uma excelente comédia que consegue chegar a dois públicos distintos: a juventude actual, e os pais, que foram jovens há vinte anos, porque faz alusões directas a vários elementos culturais que foram muito familiares aos jovens de há vinte anos. Pessoalmente, eu ainda era muito novo em 2002, estava prestes a entrar na adolescência, mas também a mim me tocaram alguns aspectos mais nostálgicos.
O roteiro é razoavelmente simples, mas funciona bem: tudo começa com Stephanie, e a forma como ela decide tornar-se popular e aceite após ser desprezada na escola. As coisas correm bem e ela torna-se no arquétipo da adolescente perfeita: ‘sexy’, loira, chefe de claque, sexualmente expedita, detentora de um namorado invejável e um futuro promissor. A cereja em cima do bolo ia ser a eleição dela como Rainha do Baile de Finalistas do Liceu, e uma after-party de arromba, com direito à perda da virgindade. Não aconteceu: numa elaborada coreografia de dança, e por obra de uma rival, ela cai e acaba hospitalizada, em coma, durante vinte anos. Em 2022, por fim, ela acorda para uma realidade horrível: o corpo dela mudou, a vida passou, o namorado casou com a rival dela, ela não é a mesma e não tem nada do que desejava. Assim, ela decide voltar ao Liceu, terminar o que começou e ser Rainha do Baile… sendo que o Liceu aboliu essa eleição!
O roteiro procura incluir uma série de alusões culturais aos anos 90 e 2000, que vão desde filmes e séries (_O Sexo e a Cidade_, _Impacto Profundo_, _Aly McBeal_, _As Meninas de Beverly Hills_), canções e artistas musicais (Britney Spears, Madonna, Mandy Moore) e objectos da moda e da cultura de massas (o Tamagotchi, por exemplo). Nós, que nos vimos adolescentes entre 2000 e 2010, conhecemos bem estas coisas, foram as nossas manias e modas. O filme também faz críticas à forma como a juventude actual encara as causas sociais, ambientais, a vida virtual e as redes sociais. De facto, é fácil perder a noção da realidade quando temos o Instagram e o Facebook cheio de milhares de amigos e seguidores, e o filme critica os jovens que passam a maioria do tempo nessas redes e os “influencers” que ganham muito dinheiro à custa deles, além de fazer piadas com a forma pouco sincera com que muitos jovens encaram as causas ambientais e ecológicas, que seguem por moda e não por terem real consciência da sua importância. O filme é bastante inclusivo, e há várias personagens que são de etnias diversas ou homossexuais, explicita ou implicitamente. Isso é algo em que os filmes de Hollywood têm insistido muito depois do movimento Me Too e do boicote aos Óscares por parte de actores negros, há uns anos, e eu compreendo, embora não goste de ver os filmes usados para fazer activismo político-social.
O elenco conta com uma poderosa Rebel Williams no papel principal. Ela não é uma actriz novata e já nos mostrou o que pode fazer em outras comédias como _As Vigaristas_ ou em filmes de dança como _Ritmo Perfeito_, e eu atrevo-me a dizer que é um dos rostos mais promissores da comédia australiana neste momento. O filme conta ainda com excelentes participações de Justin Hartley, Sam Richardson, Zoe Chao, Mary Holland e Chris Parnell. Cada um fez o seu trabalho de modo muito empenhado, sendo que Chao, Richardson e Holland merecem um louvor especial. Quanto ao elenco mais jovem, eu destacaria a boa performance de Angourie Rice e ainda Jade Bender. O filme conta ainda com um cameo de Alicia Silverstone, que já fez filmes semelhantes no seu passado, como todos sabemos.
Tecnicamente, o filme aparenta ser muito discreto, no geral. A cinematografia é regular, não há grandes artifícios visuais e a câmara opta por um estilo de filmagem convencional. Filmado na Geórgia, mas ambientado no Maryland, o filme escolheu bem os locais de filmagem e constrói muitos dos seus cenários sobre a tela verde, em animação CGI, de qualidade e cara. A banda sonora faz bom uso de canções populares da música ‘pop’, em vozes reconhecíveis, e há algumas coreografias de dança muito boas onde Williams brilha.
Em 05 Sep 2022