Autor: Filipe Manuel Neto
**Tiroteios, violência, insultos, cinismo, inteligência e Bruges.**
Este é um filme que não serve para qualquer público, principalmente, eu creio, aqueles que são ou vivem na cidade de Bruges, na Bélgica. E eu digo isso porque senti que o filme não foi nada simpático com esta bonita cidade, uma das cidades mais icónicas da Flandres, e um antigo e importante entreposto comercial, com que Portugal teve relações comerciais privilegiadas na Idade Média. É uma cidade magnÃfica e muito bem conservada, que o filme insulta bastante.
O roteiro é simples: dois assassinos profissionais fogem de Inglaterra e escondem-se em Bruges, conforme as ordens do seu chefe. Porém, o que acontece depois é que cada um deles vai viver aqueles dias à sua maneira, interagindo com a cidade de uma forma individual e pessoal, enquanto aguardam as próximas instruções.
O filme não podia ser mais provocatório e incorrecto: os actores insultam a cidade, insultam os americanos, insultam-se entre si. Os diálogos carregados de palavrões e injúrias são agressivos e politicamente incorrectos. As cenas que envolvem o anão, e as piadas em torno dele, são muito especialmente infames. No entanto, o filme revelou-se envolvente e capaz de entreter, além de ter uma dose interessante de humor negro e de profundo cinismo inteligente, encoberto sob a dose elevada de agressividade. O pior foi, mesmo, o final, que soa forçado e pouco convincente.
Há qualidades escondidas e pouco visÃveis neste filme, que o trabalho excelente do elenco soube explorar, dando vida a personagens detestáveis, mas elegantemente construÃdas e complexas. Colin Farrell mostra todo o seu talento e foi realmente extraordinário no seu papel. Brendan Gleeson não é um actor que eu goste em particular, e penso que optou sempre por personagens algo rudes, mas foi excelente ao dar vida a um assassino bastante humano, e com princÃpios de honra, e estabelece uma excelente colaboração com Farrell. Ralph Fiennes não é o tipo de actor que esperaria ver num filme tão polémico, mas ele saiu-se muito bem e parece ter feito o filme pelo prazer de o fazer. Em certa medida, a cidade de Bruges acaba por ser uma personagem do filme, com a qual todos se vão relacionando, numa relação com altos e baixos, momentos de fascÃnio e de desprezo.
O filme é dirigido por Martin McDonagh. Ele mostrou ser um director hábil, e orientou bem o seu grupo de actores e a equipa técnica. A nÃvel técnico, o director brinda-nos com uma óptima cinematografia, que aproveita ao máximo as paisagens e edifÃcios magnÃficos de Bruges. Todos os cenários estiveram muito bem, em total concordância com a temática e o ambiente. As cenas de acção são boas, e os efeitos foram bem conseguidos.
Em 20 May 2021