Autor: Filipe Manuel Neto
**De volta à Terra do Nunca.**
Todos conhecem a história de Peter Pan, o miúdo que não queria crescer e vivia na Terra do Nunca com os Meninos Perdidos, em permanente luta contra um pirata. Neste filme de Steven Spielberg, essa história recebe uma espécie de continuação: Pan mudou-se para o nosso mundo, cresceu e esqueceu a sua vida na Terra do Nunca. Tornou-se apenas mais um adulto, consumido pelo trabalho e pela vida moderna. No entanto, quando o Capitão Gancho volta e sequestra os seus filhos, Pan é forçado a confrontar o seu passado.
Escrito desta forma, o resumo do roteiro parece ainda mais atraente do que o filme. De facto, é muito mais morno e lento do que esperava, e o simples facto de Pan ter mudado tanto pode desagradar àqueles que esperavam uma história mais próxima da original. Também me parece incompreensível como é que Pan esqueceu por completo a sua vivência num lugar tão maravilhoso.
Seja como for, Robin Williams parece convincente no papel de Pan e faz da personagem um elemento de humor, com a sua incapacidade inicial de se lembrar do passado e de se adaptar à Terra do Nunca. No entanto, o actor surge-nos muito mais contido e convencional do que noutros filmes mais notáveis da sua filmografia. Julia Roberts fez uma Sininho regular mas pouco interessante, talvez por causa do modo como a personagem foi desenvolvida. Dustin Hoffmann brilhou no papel do vilão, o Capitão Gancho. É uma personagem com um carisma muito próprio, que o actor soube captar e reforçar. Sempre ao seu redor, Bob Hoskins, no papel do servil e humilde Smee, deu-nos uma performance absolutamente hilariante, o que é de louvar vindo de um actor que não é muito habitual em papéis de cunho cómico.
A nível técnico, temos de apreciar os cenários muito requintados, que recriam com precisão os vários ambientes da Terra do Nunca. O navio pirata e a aldeia dos Meninos Perdidos estavam especialmente bem feitos. Os figurinos também me pareceram muito interessantes, no geral. Destes, destaco claramente o traje do Capitão Gancho, com uma série de detalhes minuciosos que nos trazem à memória os aristocratas franceses do período barroco.
Mas o filme não é feito apenas de coisas boas. Há algo que me desagradou profundamente: o modo como foram retratados e pensados os Meninos Perdidos. Tudo neles é demasiado moderno, demasiado urbano e "punk" para um mundo de fantasia. Podemos observar isso na forma como se vestem, nos penteados, na maneira como as pranchas de skate e as armas de paintball foram introduzidas naquele ambiente... é algo que simplesmente não casa com todo o universo da Terra do Nunca.
Em 26 Jun 2018