Autor: Pedro Quintão
"Civil War" foi uma agradável surpresa para mim, especialmente tendo em conta as minhas baixas expectativas, influenciadas pela minha experiência "Annihilation" e por todas as opiniões que li e ouvi, "MEN" que é o típico filme de terror que geralmente tenho tendência para abominar. O meu preconceito inicial derivava do medo de enfrentar um filme excessivamente político, monótono e vergonhosamente projetado para ser um Oscar Bait (só Deus sabe o quanto desprezo os Oscars Baits que os críticos norte-americanos aclamam). No entanto, este filme subverteu completamente as minhas expectativas, oferecendo uma experiência cinematográfica cativante e multi-dimensional.
A narrativa de "Civil War" desenrola-se sob a perspectiva de uma equipa de fotógrafos e jornalistas que percorrem os EUA, documentando os horrores da guerra civil. Este ponto de vista é crucial, pois proporciona uma reflexão profunda sobre os perigos do jornalismo em zonas de conflito, tal como sobre a coragem e a ambição necessária para testemunhar eventos históricos em primeira mão. Este aspeto é bem executado e tem o potencial de aumentar o respeito do público pelo trabalho árduo e arriscado dos jornalistas de guerra.
Uma das escolhas narrativas mais interessantes, e que certamente dividirá opiniões, é a imparcialidade com que a guerra civil é retratada. Os protagonistas não são apresentados como heróis, nem os antagonistas são rotulados como vilões. Este tratamento equilibrado dos lados em conflito pode ser confuso para alguns espectadores, mas trata-se de algo intencional. O argumento opta por ocultar vários detalhes e por nos tornar iguais aos jornalistas: imparciais, curiosos e ansiosos por novos acontecimentos sobre o desenvolvimento da guerra.
As cenas de tensão são abundantemente presentes, elevando os níveis de ansiedade dos espectadores. Uma das cenas mais memoráveis envolve um encontro acidental com um nacionalista lunático. Estas cenas são brilhantemente executadas e mantêm-nos num clima de suspense, proporcionando um ritmo dinâmico à narrativa.
A interpretação do elenco colabora muito com o desenvolvimento da narrativa. Kirsten Dunst parece exausta, totalmente cansada, mas ambiciosa e determinada. Wagner Moura oferece energia à sua personagem que parece observar tudo de uma perspetiva menos dramática como se já se tivesse acostumado aquele cenário quase apocalíptico. Cailee Spaeny afirmou-se numa boa revelação, entregando-se a uma personagem que me deixou com um sentimento ambíguo sobre as suas intenções.
Fico feliz por ser uma produção com o selo de qualidade da A24, que tanto para o bem como para o mal, sabe produzir filmes sempre de uma forma singular e distinta dos outros estúdios. Imaginar "Civil War" sob o trabalho de estúdios como Warner Bros, Universal ou Disney poderia resultar num produto mais banal, enfadonho e descaradamente direcionado aos Oscars.
Contudo, existem alguns pontos que não apreciei tanto aqui. Não são extremamente negativos e talvez melhorem com uma segunda visualização. Refiro-me ao próprio ato final que paradoxalmente teve tanto de épico como de anticlimático, assim como ao facto de esperar ver mais cenas da própria guerra civil, de confrontos, manifestações e etc. Um acréscimo de 15 minutos para desenvolver esses momentos teria sido bem-vindo.
Em suma, "Civil War" é um dos melhores filmes que assisti este ano, proporcionando uma experiência cinematográfica intensa e reflexiva. No entanto, adianto que não será um filme para todos os gostos devido à sua abordagem distinta.
Em 02 Jun 2024