Autor: Filipe Manuel Neto
**Ficção baseada em factos e pessoas reais.**
Esta série foi produzida por um canal de TV canadiano e teve quatro temporadas. O nome corresponde à Dinastia Tudor, das mais notáveis dinastias reais inglesas. Para aqueles que não sabem, ou não se lembram, esta dinastia deu cinco réis à Inglaterra: Henrique VII, Henrique VIII e os seus três filhos Eduardo VI, Maria I e Isabel I. Apesar disso, a série foca-se apenas em Henrique VIII e isso faz com que a escolha do título seja um pouquinho errada. Se a série é sobre a dinastia Tudor, onde está Henrique VII? E por que acaba na morte de Henrique VIII?
Ao longo das quatro temporadas há dezenas de actores que entram e saem, dando vida a várias personalidades que fizeram parte da corte. A nível do elenco, o destaque vai, claro, para Jonathan Rhys Meyers (que deu vida ao vulcânico Henrique), Henry Cavill (Charles Brandon), Peter O'Toole (numa aparição breve, como papa Paulo III) e para as seis actrizes que deram vida às rainhas que se sucederam no trono e na cama de Henrique VIII: Maria Doyle Kennedy (Catarina de Aragão), Natalie Dormer (Ana Bolena), Annabelle Wallis (Jane Seymour), Joss Stone (Ana de Cléves), Tamzin Merchant (Catherine Howard) e Joely Richardson (Catherine Parr).
Agora vamos falar sobre o roteiro. Aqui, a série comete muitos erros, alguns mais desculpáveis que outros. Em primeiro lugar, exagera nas cenas de sexo. É muito sexo gratuito, sem motivo, fora do contexto e anacrónico, em situações que nunca aconteceriam no século XVI. Tudo bem, nós não somos santos e sabemos que o sexo vende, mas precisam mesmo de transformar rainhas e damas da corte em prostitutas de rua? Pior que isso é a enorme distorção de eventos e factos históricos. Como podia uma irmã do rei de Inglaterra casar com o idoso rei Manuel I de Portugal se esse rei só se casou com filhas dos Réis Católicos de Espanha? E o modo insultuoso como a corte de Portugal, o país mais rico e poderoso do mundo naquela época, foi retratada? Há dezenas de momentos em que o roteiro atropela a História, justificando isso com os "efeitos dramáticos"... mas essa desculpa não basta para justificar mudanças arbitrárias na forma como os factos e figuras históricas foram retratados.
Por falar em anacronismos, vamos ver algum mobiliário e adereços de cena mais atentamente. Veremos alguns móveis do século XVIII em cenários que deviam corresponder a um período quase trezentos anos antes. Um dos exemplos mais óbvios é a cama de Charles Brandon na 4ª temporada, a qual é claramente barroca e tem, no espaldar, o brasão britânico da Casa de Hanôver. Basta pausar o vídeo e olhar bem. Outro problema, ainda mais evidente, é o guarda-roupa do elenco, principalmente em relação a algo tão prosaico quanto a roupa interior. Se olhar com muita atenção, especialmente nas cenas de sexo, os actores nunca têm a roupa interior que qualquer pessoa do século XVI devia usar. Isso é ainda mais evidente nas mulheres, que deviam usar saiotes e uma espécie de calção, que ajudaria a segurar as meias, juntamente com as ligas.
Conclusão: esta série não é sobre os Tudors, mas sobre a maneira como nós, no século XXI, vemos o tempo e o reinado de Henrique VIII. Quase tudo é ficção. Esqueça a história, esqueça tudo e entenda: esta série criou uma história fictícia baseada em factos e personagens reais. É ficção. Quer saber a história verdadeira? Leia um livro.
Em 24 Aug 2018